quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Sobre o Poder Local - José Eduardo Azevedo

Antes de opinar sobre o tema em apreço , não posso deixar de agradecer o convite formulado pelo responsável do “blog”, o qual muito me honra. Tentarei prestar um meu humilde contributo, com a certeza, porém, que os restantes comentadores me perdoarão pela fraca qualidade dos meus comentários, visto que não detenho, nem de perto, nem de longe, a experiência e a qualidade de escrita que todos os outros ilustres convidados evidenciam ou evidenciaram em outros “blogs” e até mesmo na comunicação social.


Posto isto,


Entendo que a planear-se uma nova configuração para o Poder Local será necessário, em primeiro lugar, identificar que tipo de democracia (representativa ou directa) estará subjacente nessa nova forma de Poder Local. Ou seja, pretende-se um Poder Local que reproduza o poder central, quer na sua formação, quer no seu exercício? Em que os eleitos são sujeitos eminentemente políticos, escolhidos no seio dos partidos e que obedecem cegamente a um programa pré definido pelos seus pares? Ou submeter o Poder Local a uma lógica de democracia participativa em que a comunidade local torna-se a base exclusiva da sua constituição, do seu exercício e da sua legitimação?
No meu entender, o primeiro modelo apontado apresenta uma grave desvantagem. Se se pretender uma configuração de poder local que obedeça a uma lógica de democracia representativa nacional, estaremos a sujeitar o exercício de tal poder a imperativos partidários. Normalmente, nestas circunstâncias, estamos perante um presidente do executivo que não está inserido na comunidade e que desconhece os seus principais problemas. Os munícipes quando votam nas eleições autárquicas irão apenas eleger alguém que o partido em causa quer por à rente dos seus destinos, normalmente em subordinação à lógica clientar-partidária.
Não pretendo com isto dizer que os autarcas eleitos devam, obrigatoriamente e devido a um imperativo legal, ser escolhidos dentro da comunidade local. Devem, no entanto, representar condignamente os interesses dos munícipes e da comunidade porque a ela estão directa e intrinsecamente ligados. O poder político deve, na minha humilde opinião, formar-se no interior da comunidade em que se exerce.
Não quero com tudo isto dizer que a alternativa é a configuração de um poder local baseado numa democracia directa, tal seria, até em termos ideológicos, contrário ao que sempre defendi.
Entendo, no entanto, que o caminho a seguir na concepção de novas regras de eleição dos representantes dos munícipes, será alargar o envolvimento das pessoas na gestão política, com diferentes graus de participação.
As Assembleias Municipais e as Juntas de Freguesia deveriam ter uma composição menos partidária e muito mais representativa da comunidade local.
A Assembleia Municipal é hoje o lugar de confronto entre partidos políticos. Na verdade, os grandes conflitos que aí se levantam são de natureza partidária. Efectivamente, tais conflitos não derivam, na grande maioria das vezes, de necessidades e carência sentidas pelos membros da comunidade local.
Com efeito, entendo que a participação de grupos de munícipes sem ligação partidária deve, cada vez mais, ser fomentada e apoiada. Isto, independentemente da ligação ou orientação política dos membros da comunidade local. Defendo que os interesses locais são muito diferentes e vão muito mais além do que, a nível nacional, o executivo eleito escolheu para programa operativo dos destinos da nação. Daí que, as comunidades locais possam ser livres na forma como defendem os seus interesses. Sem as amarras do partidarismo, ainda que a ele estejam ligadas por via do interesse político e governativo nacional.
Caso contrário, o exercício do poder local será cada vez menos apetecível. Senão vejamos:
Os executivos camarários têm pautado a sua actuação por uma lógica de “guerrilha” partidária. O interesse na obtenção de maiorias partidárias levam a que, na grande maioria das vezes, se “produza” mais quantidade que qualidade. Para muitas autarquias é sinal de boa governação apresentar ou fornecer aos munícipes não aquilo que eles carecem, mas aquilo que, à primeira vista, produz mais impacto no seio comunidade. Efectivamente, cada vez mais são utilizadas as regras de marketing no exercício do poder local. Tudo com apenas um intuito, conseguir um, já não digo óptimo nem excelente, mas um bom resultado nas eleições e que assegure os resultados pretendidos pelo partido. Quer a nível local quer nacional.
Ora, esta é, na minha opinião, a principal razão do crescimento exponencial do endividamento autárquico. Endividamento esse que irá surtir efeitos no presente mas que lança o pagamento da factura para mandatos futuros. O endividamento das câmaras só será aceitável na medida em que, aproveitando os fundos comunitários, lance obras para o futuro.
No entanto, e como todos verificamos, não são essas as obras que levam a que determinados partidos e ou seus representantes ganhem eleições.
Contudo, esgotados os fundos Comunitários, e a maior ponderações do governo na transferência de meios para o Poder Local, está irremediavelmente prejudicada a sua capacidade de actuação.
Se a este tipo de situações somarmos outros dois factores que são, a exposição mediática dos agentes políticos e a desporporcionalidade entre as responsabilidades que lhes são exigidas e as remuneração atribuídas, prevejo que num futuro muito próximo não existam candidatos ao exercício do poder local.
Ou antes, candidatos existirão sempre. Os partido políticos pugnarão sempre pela apresentação de candidatos. O que dificilmente se encontrarão são membros da comunidade local, com ou sem ligações partidárias, com uma vida profissional estável, com um currículo e experiência de vida notáveis, com o sentido altruísta de lutar pelo desenvolvimento da sua comunidade, que se apresentem como candidatos ao exercício do poder autárquico.
Entrevê-se que, nestas circunstâncias e salvo raras excepções, apresentar-se-ão como candidatos, políticos de carreira que apresentam, na maior parte dos casos, angustiantes limitações humanas e técnicas. Com um perfil delineado por forças, que não as que se destacaram na comunidade local. Estaremos perante homens amarrados a compromissos partidários e económicos, sem capacidade de intervir e, cada vez menos, interessados e abnegados em servir o cidadão.
Em suma, e para terminar, entendo que numa nova concepção de poder local devem ser valorados todos meios humanos que de destacaram, essencialmente, das comunidades locais, criando-lhes condições físicas, financeiras e humanas, para que sintam vontade de desenvolver uma actividade política ao nível municipal e intermunicipal. Que possam intervir de uma forma livre e descomprometida com interesses partidários e económicos. Nestas circunstâncias, alargando-se proporcionalmente a capacidade fiscalizadora da Assembleia Municipal, atribuindo-lhe uma maior influência nas grandes decisões do Executivo, poderia-se conceber um executivo, mais próximo dos munícipes, dirigido por um representante tecnicamente irrepreensível e humanamente reconhecido pela comunidade.


Sem comentários: